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Escrever é dar contorno à imaginação

A arte de escrever é dar vida a uma leitura de si, de uma pessoa, de um fato, de uma cena, de um universo.  A escrita deriva da imaginação.  O escritor olha para um velho e imagina o que a postura dele revela sobre o peso que viveu, o que a roupa traduz da sua personalidade, o que o seu olhar diz sobre o que sente.  Pela expressão do rosto, imagina se ele ainda tem consciência; pelo tom de voz, se é gentil ou rude.  Imagina se mora sozinho, se tem amigos, se tem família.  E numa sucessão de imaginações, constrói a sua narrativa.

O escritor é um observador que enxerga a alma das imagens e a transporta para o papel.  Um compositor que escuta e traduz as notas dos silêncios.  Ele rege uma combinação de palavras que faz o leitor ver, cheirar, tocar, escutar, entrar nos personagens, nas emoções.  Essa condensação de sentidos que emana vem do seu processo contínuo de reparar.  Ele se aproxima e se distancia do que vê e sente, se isola e se entrega.

É uma escrita nascida de uma série de leituras que faz ao longo da vida.  Por meio dos livros, o escritor atiça e alimenta a sua imaginação, descobre lugares, pontos de vista, caminhos, personalidades, possibilidades, estilos, percepções.  Nesse sentido, quanto mais leituras faz, mais rica e original a sua obra.  

Mas para escrever é preciso coragem.  Na imaginação do escritor residem os mais diversos sentimentos.  Muitas vezes é doloroso lidar com eles.  São sentimentos percebidos na menina da esquina, que não para de medir a cintura com as mãos; na velha do ponto de ônibus, com o cacoete de dobrar a parte superior da orelha esquerda; no olhar do menino que caminha olhando para o chão, ao lado do pai aos berros no celular.  Ao materializar a imaginação na escrita, o escritor encontra a salvação: ele dá contorno ao que imagina.  No papel, tudo cabe e todo peso é suportado.  O escritor dá cor e forma às ideias que pulsam e escoa o excesso pelas margens.

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